terça-feira, 27 de abril de 2010

Conversa com Ataliba... o mestre da cognitiva na veia

(Prof. Ataliba Teixeira de Castilho, crédito: Jornal da Unicamp)

Em 2005, em um Encontro Nacional dos Estudantes de Letras, tive um embate rápido com o Professor Antonio Carlos Xavier (Lattes), da Universidade Federal de Pernambuco-UFPE. O assunto era o seu livro "Conversas com Lingüistas: virtudes e controvérsias da lingüística" (Sao Paulo: Parábola Editora, 2003), em coorganização com Suzana Cortez.
Durante uma palestra dele de divulgação do livro em questão, fiz uma pergunta sobre qual o principal intuito daquela publicação, divulgação científica ou um convite aos estudantes de Letras para conhecerem mais a linguística? O que eu não esperava era que o prof. A. C. Xavier meio que se ofendesse por eu ter considerado o seu livro como 'apenas' de divulgação científica, apesar de ele mesmo mencionar isso como um dos objetivos da coletânea de entrevistas reunidas no citado livro.
Bem, fora as digladiações, saudáveis, do mundo acadêmico, tive uma surpresa hoje ao folhear o dito livro e bater os olhos no nome do inspirador do nome deste blog: o Prof. Ataliba Teixeira de Castilho (Lattes). Em uma das perguntas-roteiro do livro, tive a grata satisfação de ler a seguinte opinião do mestre, a qual transcrevo:

"Como a Lingüística se insere na Pós-modernidade?


A resposta está toda ela dada pelo pessoal que está fazendo pesquisa em lingüística cognitiva. Nessa orientação de estudos, disciplinas que tinham sido separadas passam a buscar uma interação, numa forma obrigatoriamente interdisciplinar. Os cognitivistas estão, neste momento, fazendo o que parecem ser as questões últimas, as questões extremas do comportamento lingüístico humano. Alguma coisa ue invade, portanto, o modo como a mente opera, propondo-se categorias para se explicar como é que a mente opera, ao menos para se ter uma percepção disso. E aí, todas as distinções clássicas sobre as quais se ergueu a lingüística no começo do século XX, tudo isso se dissolve. Sincronia, diacronia, língua, fala, código, uso, tudo isso se dissolve. Então, é um momento em que estas questões estão sendo apresentadas e acho que a lingüística cognitiva vai plasmar uma nova lingüística muito diferente daquela com a qual nós temos mexido até aqui, com seus campos bem definidos. Isto mesmo que eu acabo de mencionar, esses sistemas todos, tudo poderá ser profundamente reformulado. É muito difícil em poucas palavras caracterizar a agenda cognitivista, mas já há um conjunto de teorias que estão rodando por aí: a teoria dos protótipos, a teoria dos espaços mentais, a teoria da metáfora, a teoria da própria gramática cognitiva, a semântica como estudo da criação de significados, como é que esses significados são gerados, e não de observação de significados prontos prontos e acabados. Este é um momento de muita efervescência na lingüística. Penso que isso vai colocar no centro das questões o que era um pouco considerado perifericamente. O caso da metáfora é o exemplo mais dramático. O que se considerava como um fato anômalo, uma figura da linguagem, de repente você vê que o anômalo é o contrário disso. Tenho a impressão que a lingüística pós-moderna se fará no campo da lingüística cognitiva. Na Unicamp, a professora Mary Kato tentou até instalar esse domínio de cogitações, que não poderia ser um domínio encapsu-lado no Departamento de Lingüística. Mas hoje eu vejo que quando ela propôs isso, lá por 1987, fim dos anos 1980, hoje vejo que sua proposta não foi compreendida, embora ela tivesse razão.
" (Xavier; Cortez, 2004, p. 58-59)

Mesmo não gostando muito da pergunta dos organizadores, pois é perceptível que todos os outros entrevistados tem ideias diferentes sobre o que seja pós-modernidade, as palavras do mestre são bastante motivadoras. Sem falar na outra surpresa que tive, no finalzinho, sobre a professora May Kato, tentando instalar discussões da Linguística Cognitiva na Unicamp...

Para maiores informações sobre o "Conversas com Lingüistas..." vai esta resenha publicada na DELTA: (clique aqui).

segunda-feira, 19 de abril de 2010

tESTE de Paternidade


Como todos sabem, o programa gerativista desde sua tenra idade, teoria X-barra padrão, até sua fase pós-adolescente, minimalista, tem como figura central Noam Chomsky, inegavelmente o Papa das teorias formais em linguística.
Da mesma forma, as teorias funcionalistas em linguística tem lá seus papas. Micheal Halliday com sua Gramática Sistêmico-Funcinal e Talmy Givón, com o seu famoso "On Grammar".
Como não poderia ser diferente, apesar de se dizer que na Linguística cognitiva não existe nenhum papa, a atual "bibria" dos cognitivistas, o "The Oxford Handbook of Cognitive Linguistics" (Geeraerts e Cuyckens, 2007: 7) apresenta os linguistas George Lakoff, Ronald W. Langacker e Leonard Talmy como os pais fundadores desse novo empreendimento em linguística. Para não apenas dar nome aos bois, apresento rapidamente abaixo a trindade citada. Infelizmente não encontrei nenhuma charge dos três como a de Chomsky mostrada acima, encontrada em um dos aplicativos do Facebook, então vão essas mesmo.

Este é George Lakoff, conhecido por alguns como o dissiente da Gramática Gerativa nos seus primeiros anos, ao propor com colaboradores a Semântica Gerativa. Porém, foram excomungados sem dó nem piedade pelo Papa Chomsky. Acusação: extremo abuso conceitual, principalemente quanto ao uso dos conceitos de Deep Structure (Estrutura profunda) e Surfice Structure (Estrutura de superfície), tão caros às primeiras análises da então conhecida Gramática Gerativo-Transformacional. É bastante conhecido pela sua Teoria da Metáfora Conceitual, apresentada em coautoria com Mark Johson em 1980 com o título: "Metaphors we live by", com tradução para o português com o título: 'Metáforas da vida cotidiana'. Entre seus livros mais famosos, encontra-se este com o título bem marketeiro "Woman, fire and dangerous things" no qual ele elabora sua teoria dos Modelos Cognitivos Idealizados, a partir dos trabalhos sobre categorização em Psicologia Cognitiva. Lakoff é atualmente professor na Universidade da Califórnia em Berkeley, estando ocupado no momento com a teoria neural da metáfora e a teoria neural da linguagem, juntamente com colaboradores.


Na foto ao lado, em uma de suas raras aparições no mundo das famosidades linguísticas, está Ron Langacker, mais conhecido pela sua teoria da Gramática Cognitiva, principalmente nas suas publicações de fôlego e peso, com dois volumes, de 1987 e 1991, respectivamente. Além de uma publicação mais recente: "Cognitive Grammar: basic introduction".
Atualmente, é professor na Universidade da Califórnia, San Diego, e se ocupa atualmente na divulgação da sua teoria da Gramática Cognitiva, inicialmente denominada Gramática Espacial, além de expandir seus pressupostos para outros níveis de análise linguística.






E por fim, a Trindade Cognitivista fundadora encerra com Leo Talmy, dono de um estilo hiperacadêmico de texto, tendo como maior contribuição e melhor exemplo de seu estilo os dois grande volumes do "Toward a Cognitive Semantics", vols. I e II, que podem ser baixados nos links da indicação de volumes.
É professor da Universidade Estadual de Nova York, em Buffalo, (sorry a 'translation'!) tendo atuado por muitos anos no famoso Massachusets Institute of Technology, considerada a Roma do Papa Chomsky.








Há muitos outros autores que contribuiram e contribuem para o desenvolvimento das teorias em Linguística Cognitiva, só para citar alguns, temos Gilles Fauconnier, Mark Turner, William Croft, Adele Goldberg, Dirk Geeraerts, John Taylor, e muitos outros para os quais espero poder oferecer algumas referências mais adiante.
O teste de DNA, neste caso o crivo acaêmico, já mais que provou e aprovou a(s) paternidade(s) da LC (linguistica cognitiva).

sábado, 17 de abril de 2010

Que cognitiva em linguística? II

O post anterior, que deveria fazer jus ao título com uma discussão sobre o que se entende por "cognitivo" em linguística, acabou na verdade sendo uma proposta de textos introdutórios à abordagem cognitivista em linguística. Mas deixando a carroça andar...
Para estudantes de Letras, linguística e disciplinas correlatas, se deparar com uma linguística que leve o adjetivo "cognitiva" é talvez lembrar do que se encontra vez e outra em textos introdutórios sobre a chamada revolução cognitiva desencadeada nos idos de 1960, e que apresentam a figura de Noam Chomsky como um dos principais pivôs. Em livros de divulgação às ciências cognitivas, como o quase best-seller "The new science of mind" (A nova ciência da mente) de Gardner, e em muitos outros sobre as ciências cognitivas, não é difícil encontrar a Linguística, juntamente com a Antropologia, a Inteligência Artificial (IA), a Psicologia, a Neurociência e Filosofia entrarem na constituição, tradicionalmente conhecida, das ciências fundadoras da Ciência Cognitiva (no momento não iremos adentrar em detalhes sobre o uso de maiúsculas e singular aqui no lugar de minúsculas e plural na denominação dessa(s) ciência(s)). No heptaedro abaixo, foi incluída a educação (Retirado da Wikipedia):




































Daí pode surgir a questão: se Chomsky foi cabeça na chamada primeira revolução cognitiva e leva o nome também associado ao programa de pesquisa gerativista, em que a Linguística Cognitiva se difere da linguística chomskyana no quadro geral das ciências cognitivas?
No "The Oxford Handbook of Cognitive Linguistics", Geeraerts e Cuyckens tentam localizar as duas correntes em momentos distintos na história das ciências cognitivas. A linguística autônoma, como os autores chamam a linguística gerativista, seria parte da primeira revolução cognitiva, dos idos de 1960, enquanto que a Linguística Cognitiva seria da segunda revolução cognitiva, desencadeada por novas descobertas nas áreas das neurociências e por um paradigma conhecido como ciências cognitivas corporificadas.
Fora essa distinção histórica, fica ainda umas pitadas de dúvida. A gramática gerativo-transformacional, desde as suas primeiras versões, na teoria X-barra padrão até os dias atuais na sua versão minimalista, guarda como um ponto de trabalho crucial a premissa de que a faculdade da linguagem é um produto da mente/cérebro de um falante ideal. Em que isso difere dos pressupostos de uma linguística que toma para si o qualificativo "cognitiva"? Nesse ponto, as duas linhas de estudos da linguagem não precisam se estaponar. Tanto a Gerativa como a Cognitiva dão atenção ao peso que a cognição humana oferece para o entendimento do que vem a ser a linguagem. A grande diferença aqui recai novamente em um outro "ponto de articulação". Enquanto a Gerativa toma a premissa de que a faculdade da linguagem é caracterizada por ser um módulo a parte de todo o resto do aparato cognitivo humano, para a Linguistica Cognitiva tal módulo não existe. A linguagem humana é e faz parte de todos os outros mecanismos cognitivos, como memória, atenção, percepção, categorização, etc. À primeira vista parece uma pequena distinção, mas que faz uma grande diferença.
Em resumo, a Linguística Cognitiva toma para si o compromisso de uma verdadeira inserção entre as ciências cognitivas em geral, de modo a contribuir eficazmente para o desenvolvimento de teorias sobre o funcionamento da mente/cérebro. Tanto é assim que os autores que se alinham a tal perspectiva concordam que um programa de pesquisa em Linguística Cognitiva deve levar em conta dois compromissos-chave (key commitments), conforme descrito no The Cognitive Linguistics Enterprise: an overview: o compromisso de generalização e o compromisso cognitivo. Em rápidas palavras, o primeiro busca generalizações acerca das propriedades da linguagem para todos os possíveis níveis de estruturação linguística, isto é, fonológico, morfológico, sintático, semântico, pragmático, etc; o segundo defende que as generalizações buscadas devem estar de acordo com outras descobertas no seio das outras ciências cognitivas, de modo a se elaborar um quadro da cognição humana o mais coeso possível.
Desses compromissos já se vê que uma teoria da linguagem que advogue um único nível responsável pela centralidade de estruturação linguística, no caso a sintaxe, e que também defenda a ideia de um módulo, mesmo que interdependente de outros módulos da cognição humana, torna-se problemática para continuar tomando para si a tarefa de entender a cognição humana.
Em últimas palavras, o cognitivo em Linguística Cognitiva é um verdadeiro compromisso com a cognição.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Que cognitiva em linguística?

Voltando ao blog!

Talvez eu devesse iniciar por um texto bem introdutório sobre "Linguística cognitiva: o que é, como se faz", mas, aproveito o que já tem sobre o assunto. Aqui vão alguns links de introdução à linguística cognitiva, escritos em português:

Introdução à linguística cognitiva

Cognição: conceitos básicos e aplicações segundo a ótica de Laura Janda

Nesses dois textos, apesar das idiossincracias esperadas, são uma boa pedida para neófitos da área. Isso para quem não arranha muito bem o ingrês...
Pelo web tem outros textos em pdf de introdução à linguística cognitiva, a maioria em inglês.
O site da International Cognitive Linguistics Association é um bom começo, pena estar tão desatualizado.
E, como não poderia deixar de ser, o velho verbete da Wikipedia.

Acho que de todos os "overviews" a que tive acesso quando ainda estava bracejando nos inícios das minhas leituras, o The Cognitive Linguistics Enterprise: an overview do Prof. Vyvyan Evans e colegas foi o mais esclarecedor. Bem didático mesmo.

Bom, espero que depois dessas leituras "desobrigatórias", eu comece a ser mais regular nos posts...

Boas leituras cognitivistas!!!